segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Arte Como Estranheza e Grosseria

Estou certo de que a arte, em geral, a literatura, em particular, tem de manifestar alguma "estranheza". Sem ela, não há verdadeiramente aquilo que denominamos arte. Também não consigo imaginar que a arte não possua algum nível de compreensão, entendida não como algo objetivo que é delimitada pelo sujeito, mas pela percepção ampla que revindica para o apreciador certo de nível de aprisionamento da ideia por detrás da obra. Há que se aceitar que nesse vasto campo perceptivo possamos atrair para ele múltiplas formas, conteúdos, cores e meios.
Também há o compasso do tempo que envolve a arte. Aqui, o envolvimento da obra por um certo "espírito do tempo" acomoda a obra e seu autor junto aquele que vislumbra a produção do artista. Trata-se de "acomodação" vez que o tempo não escraviza necessariamente a obra com o compromisso de uma época. Pode, inclusive, romper os limites temporais para explorar campos nunca vistos. Projetados no presente, pode-se revolver o passado, alterando-o, ou fustigar o futuro com ilações e composições que permitem aguçar a imaginação, criativa e sensivelmente. Nesse caso, o esforço do pensamento pode transcender aquém do que imagina o próprio autor. Obras de arte fogem de seus autores e percorrem múltiplos campos e, somente assim, é que se pode falar em plenitude da arte.
O descompromisso estético e temporal da arte, ao permitir transcendência além das fronteiras verificáveis no presente, apenas poderá ser reunida como parte da "história" quando lá no futuro se puder pensar sobre se a experiência artística foi coletiva ou apenas individual. Ao se tornar parte do passado, os estudiosos poderão analisar diacrônica e sincronicamente um extrato do tempo e, assim, fazer a "teoria" daquela arte.
Nesses tempos de cólera, no qual as tensões sociais, econômicas e políticas estão aguçadas, fico a imaginar o que terão a dizer os cultuadores, ou melhor, os críticos de arte de nosso tempo e que escreverão no futuro. Haverá generosidade para com os descompromissos estéticos de hoje? Como serão distinguidas aquilo que será considerada "arte" e aquilo que se constituirá, quiçá, em "puro mau gosto".
De minha parte não me escuso do direito de me pronunciar sobre meu desapreço por certas manifestações. Não estou a me referir a distinção provocada pela "estranheza", goste ou não dela. Estou a me referir, por exemplo, aos happenings de Jean-Jaques Lebel (1936 -     ) que fazia La Tarte, a personagem de um livro de Picasso ("O desejo pego pelo rabo"), urinar durante dez minutos em plena cena. Nesse diapasão, podemos encontrar muitas outras grosserias que se espalharam pelo mundo, dos shows "profanos" de Madonna até a "música sertaneja-universitária", no Brasil. 
Creio que o fato de estarmos em mundo da livre expressão permite que nos manifestemos sobre certas estranhezas, mesmo que seja para dizer que estas não passam de grosseiras expressão e que, no caso, não são propriamente "arte".
É preciso depurar agora um pouco do prazer da vida retirando da frente o que lhe reste ruim...