quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

"Além da Vida" de Clint Eastwood Trata da Vida

Clint Eastwood é daqueles atores e diretores de cinema que melhoram como os vinhos: o tempo lhes é um benefício e elevam os seus elementos a uma órbita superior. No caso de Eastwood este processo de superação enquanto diretor iniciou-se, do meu ponto de vista, a partir de Unforgiven (1992), com o qual ganhou o Oscar de melhor direção. Há mais: Clint Eastwood conseguiu evoluir preocupando-se com os detalhes e retalhos de cada cena de seus filmes. Não confecciona, mas se comporta como um alfaiate. Seguiu o padrão do grande diretor que se comporta verdadeiramente como um autor de talento de livros e romances. A cada palavra (cena) ele consegue apurar à perfeição a melhor tradução em forma. Sobra-lhe elegância num mundo do cinema onde impera a agilidade fácil com a cena e, desta forma, propaga-se a vulgarização da idéia por meio da forma. (Não nos demoramos a descobrir isto, não é mesmo?).
Em Além da Vida (Hereafter, 2010, EUA, com Matt Damon, Cécile de France e Lyndsey Marshal) encontramos não apenas a direção elegante de Clint Eastwood. Neste filme propaga-se a beleza com que é tratada uma estória que tinha tudo para resvalar para o lugar comum. O roteiro conta a relação das pessoas com a morte. Há em cada um dos personagens uma procura específica pelo que acontece do outro lado da vida. As transformações pelas quais os personagens passam são, pouco a pouco, entronizadas em seus cotidianos os quais se tornam diferentes frente às possibilidades que aparentavam existir antes de perderem os seus entes queridos ou contemplarem a morte de perto. Um tema delicado tratado com mais delicadeza ainda.
De fato, o filme não trata daquilo que está Além da Vida. (Neste sentido o título em inglês Hereafter é muito mais feliz a meu ver). O roteiro é simplesmente fantástico. Consegue "projetar para trás" o evento da morte. Há um enorme encontro entre as pessoas e a sua própria humanidade. A impossibilidade de compreender a perda de alguém é um fator que  é apurado a favor do ser humano e não contra ele. Os personagens são acomodados em seus próprios sentimentos e, por conseguinte, o roteiro explora cada um a partir de sua própria intimidade. Tudo muito lindo e, quando transformado pelas belas imagens de Eastwood, o filme ganha um traçado ainda mais encantador. Sobra emoção. A compreensão consiste em entender a si mesmo, a perceber que não existe nada que justifique a nossa opressão interior Na Vida e não Além da Vida. Uma inversão de concepção dificílima de ser feita, mas que Peter Morgan, o roteirista, consegue fazer com arte e destreza, seja pelo conteúdo, seja pelo ritmo impecável dos diálogos. Não há exibicionismo ou ostentação em relação ao tema. Apenas a armadilha de nos jogar com sutileza em frente da vida e não da morte. Cada um é cada um diante da vida que é de todos (e a morte também).
Cécile de France é o destaque entre o elenco, muito embora a atuação de Matt Damon seja excelente. Todavia, a atriz francesa está segura e consegue segurar os suspiros perante sua beleza provocante por meio da fortaleza dos sentimentos de esperança, abnegação e coragem que projeta. Um presente dos deuses. No começo do filme ela é ressuscitada. Ao seu final ela nos ressuscita. Dá uma vontade louca de abraçá-la. (Quem assistir ao filme entenderá o que estou a dizer).
Honoré de Balzac, faz reaparecer em cada uma das obras que compõe A Comédia Humana os personagens que fazem parte de outras criações. Esta "ressurreição" foi uma das maiores revoluções literárias de todos os tempos e o nascimento de um estilo de romance copiado por outros grandes escritores. No filme de Clint Eastwood, mal comparando com Balzac, as personagens ressuscitam: elas saem de dentro de si e ganham a tela. Quem viver, há de emocionar. Alguns até as lágrimas. 



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