quinta-feira, 6 de maio de 2010

A Guerra Civil Espanhola Num Bom Livro

A esgarçadura do tecido social das nações e as suas trágicas conseqüências sempre foi um desafio para a análise e detecção dos fatos que provocaram a radicalização de correntes e segmentos políticos. A escolha dentre os fatos históricos estudados não é um processo seletivo simples. Certos movimentos, fatos e processos podem parecer determinantes para a eclosão de mudanças, mas nem sempre são. E vice-versa. Isto porque a política tem um andamento marcado por nuances que vão do proselitismo de seus partícipes até fatores que contribuem para consolidar mudanças estruturais e novos paradigmas. No caso dos processos revolucionários estas características se tornam ainda mais difíceis de serem destrinchados. O historiador não pode cair na cilada de agir nem como um repórter dos fatos e nem analisá-los como se estes fossem processos econômicos, sociais ou políticos. Há que se ter muita arte.
A Batalha pela Espanha – A Guerra Civil Espanhola 1936-1939 (The Battle for Spain – 2006 – Editora Record- Tradução de Maria Beatriz de Medina) do escritor inglês Antony Beevor é uma interessante obra que conta em detalhes a guerra civil da Espanha. O escritor é um ex-militar, membro do notável regimento dos Hussardos do exército britânico e autor de Berlim 1945: A queda e O mistério de Olga Tchekova e Stalingrado. Todos os livros do autor receberam aplausos dos críticos e boa recepção dos leitores em todo o mundo.
O livro é uma obra detalhada e que segue a cronologia dos fatos, amarrando-os de forma relativamente segmentada: relata a evolução das campanhas militares entre os Nacionalistas de Francisco Franco e os Republicanos, o amontoado de partidos de esquerda, bem como a lógica do poder e a sua conquista (ou não) por parte de cada uma destas correntes. Note-se que a Alemanha de Hitler fez a sua reestréia militar depois da I Guerra Mundial nos campos espanhóis, apoiando Franco e estabelecendo com ele uma relação solitária relativamente aos países democratas de então, sobretudo o Reino Unido. De outro lado, a jovem nação socialista, a Rússia, abria o seu front mais a oeste. Era a guerra fria de então.
A Espanha durante o final do século XIX e até meados dos anos 30 do século seguinte passou por mudanças bruscas, da Monarquia decadente para a República incipiente, pela dinamização das classes sociais dentro de um processo de urbanização, pela formação de sindicatos atuantes, pelas divisões e subdivisões dos partidos políticos (da extrema esquerda à direita reacionária) e pela crescente interferência do poder militar sobre o civil. Não houve naquele país nenhuma força centrífuga na política que evitasse a cristalização das posições de cada lado e o subseqüente choque militar que resultou numa das mais cruéis e fraticidas guerras civis no Velho Continente.
Estudar este processo é interessantíssimo não apenas para entender a Espanha de então e de hoje, mas também para perceber os enormes erros de diagnósticos dos políticos (e militares) no que se refere ao processo social e político. Destes erros nasceu a ausência de qualquer visão civilizada que neutralizasse os extremos e viabilizasse uma saída reformista. Beevor relata tudo isto e dá ao leitor múltiplas possibilidades anlalíticas, inclusive a de transportar para a nossa realidade atual algumas das visões equivocadas da direita e esquerda de então na Espanha e de seus parceiros estrangeiros.
Por fim, vale mencionar que Antony Beevor, dada a sua formação militar, dá um peso substantivo às estratégias militares e o desenrolar das batalhas. Isto torna o livro um pouco confuso em alguns momentos para os leitores leigos sem que isto comprometa o resultado abrangente ofertado ao público.
A guerra nunca é fascinante. Todavia, os processos por ela engendrados são fascinantes para aqueles que pensam as ciências sociais ou estão interessados na história de seu próprio país. Não fosse o custo humano, a guerra seria um jogo educativo no qual os resultados são sempre negativos, mas determinantes da história. Entendê-los é entender as contradições e sínteses das sociedades. Eis uma leitura interessante, muito além das suas pretensões específicas. 

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