quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Em "Chéri", o Amor Faz Suas Exigências

Nos mais de 50 livros escritos por Sindonie-Gabrielle Colette (1873-1954) foram projetadas as imagens e comportamentos que ainda hoje são objeto de discussão e análise do comportamento social e psicológico (ou será psicanalítico?) da sociedade ocidental. Sua criação artística esteve por muito tempo associado à Belle Époque na qual a arte rebuscada se somava ao período de extraordinária evolução da ciência e da tecnologia. Todavia, a temática de seus escritos explorou o amor, o sexo e o comportamento social num contexto de vanguarda. Ficou distante do proletariado que ascendia nas sociedades industriais e o anarquismo e socialismo, movimentos desastrosos de contestação.
Chéri 
Há muito Colette merecia ver transformado na tela o seu romance mais famoso, Chéri. (Para ser bem sincero, desconheço se já foi filmado antes). O filme homônimo Chéri (2009, Alemanha/França/Reino Unido, dirigido por Stephen Frears, com Michelle Pfeiffer, Rupert Friend e Kathy Bates) é muito fiel às idéias, ao contexto e a caracterização dos personagens de Colette. Trata-se da estória do relacionamento de Léa, uma cortesã balzaquiana de 36 anos e um jovem mimado (Chéri), filho de uma ex-cortesã alçada pelo casamento à riqueza, Madame Peloux. Tudo começa com se fosse um processo de "educação" pelo qual Chéri passa a viver com Léa. Tudo com a benção e o arranjo de sua mãe. Depois de seis anos bem vividos sob o fogo da paixão e do sexo, Madame Peloux consegue um casamento arrumado de Chéri com a jovem Edmée. Trata-se da perfeita transformação social necessária para a afirmação do jovem e de sua mãe ex-cortesã na sociedade burguesa de então.
Ocorre que Léa caiu na trama do amor. O affair do início do casamento também toma a forma do amor, mesmo que este não seja revestido das necessidades burguesas propagadas por Madame Peloux. Chéri está em meio a um jogo do qual não conhece as regras e nem possui os talentos para jogar. Apenas se apaixona e depois descobre a duras penas que ama. É interessante ver como Collete põe tudo em perspectiva: o amor tem suas necessidades e exigências. Não tem jeito. Sejam as razões sociais ou aquelas do fundo da alma, não existe nem o pretenso encanto de uma vida irresponsável nos braços de uma cortesã e nem a solução "neutra" de um casamento interesseiro. Por todos os lados, acabam respingando responsabilidades e cobranças. O que vale a pena mesmo é o amor, mas não é certo que ele exista.
Michelle Pfeiffer está belíssima neste filme. A idade lhe fez bem e a sua interpretação é madura, competente e luminosa, apesar de seu parceiro de cena Rupert Friend ser um mancebo inconstante na estória e na interpretação. O grande show mesmo fica por conta de Kathy Bates que interpreta Madame Peloux. Ela domina tanto a arte que diante dela todos ficam diminuídos. Coisa de atriz de boa cepa.Tudo isto apesar de Pfeiffer estar em excelente forma, como já dissemos.
A direção de Stephen Frears (britânico que dirigiu uma longa lista de filmes, entre os quais, A Rainha, Liam e Alta Fidelidade) é competente e o seu domínio da direção cênica é pleno. Parece claro o que ele quer fazer e faz. O filme não tem disfarces e nem truques. Tudo é simples e correto.
O ponto mais forte do filme é a direção de arte. Dos figurinos até a harmonia dos cenários com  a fotografia tudo é perfeito como num quadro renascentista. 
Quando terminamos de assistir Chéri ficamos com a nítida sensação de que o tempo que passou para a personagem de Michelle Pfeiffer no filme não foi gasto à toa por nós, meros pagantes das bilheterias. 

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