segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Avatar, Demasiadamente Humano

Se Avatar (2009, com Sam Worthington, Sigourney Weaver, Michele Rodriguez e Giovani Ribisi), vale o meio bilhão de dólares gasto, somente um excepcional especialista em tecnologia digital aplicada pode avaliar. Uma coisa é certa: o filme em 3D impressiona pela qualidade estética e pela execução cênica, dentre os seus enormes méritos. É difícil mensurar onde está o valor da mão do diretor  James Cameron (o mesmo de Titanic) e dos respectivos técnicos e qual é o valor da tecnologia usada na consecução do filme. Aparentemente, o público já o consagrou na medida em que apenas no primeiro fim de semana a bilheteria de Avatar alcançou a cifra de pouco mais de US$ 260 milhões, sendo cerca de US$ 80 milhões apenas nos EUA. Não serão as palavras escritas de um blog que poderão transmitir a experiência de ver o filme. É preciso ir assisti-lo para que a pretensão maior de Cameron - arrebatar a admiração do público pela sua execução tecnológica - possa de realizar de fato. Este objetivo é alcançado - bem vindos ao mundo pós-moderníssimo!
De minha parte, o que me chamou a maior atenção foi o roteiro do filme, este também escrito por James Cameron. Nele a criação é uma bem realizada transposição para o campo do fantástico da realidade humana que mais facilmente possamos garimpar no nosso cotidiano ou nas páginas de qualquer jornal no mundo. Neste estrito sentido, não há novidade no filme. Avatar reproduz todas as ambições mais mesquinhas do ser humano desde que Adão e Eva traíram o Criador. 
Pandora, o imaginário planeta onde se passa o filme, poderia ser facilmente a Terra nos seus primórdios (históricos e, possivelmente, imaginados). Cameron seria o desconhecido autor do Gênesis, o primeiro livro sagrado da Bíblia. Não há para o homem, conforme infelizmente aprendemos cotidianamente, limites aos rancores, ambições desmedidas, maldade e assim por diante. 
Cameron, não roga nenhuma praga aos seres humanos que tentam colonizar Pandora e os seus clãs nativos, os Na´vi, estes também humanos "geneticamente modificados". Apenas deixa os terráquios agirem como sempre: sob o signo da aventura movida pelo egoísmo desmedido e no uso da mais corriqueira arma de conquista, a violência. Ah sim! Na tentativa de conquistar Pandora, a força-tarefa humana (bélica), a serviço do "capital privado", não respeita sequer a árvore da vida (Eywa). Por estes lados de nosso planeta, aqui e agora, há lugar para Deus?
Bem, há ainda a conversão de certo conquistador (Jake Sully) a partir da iluminação de sua mente pela agonia dos conquistados. Sim, há o Amor, Agápe, aquele que Platão tão bem descreveu. (Sully ama além de sua própria amante, a princesa Neytiri).
O filme me lembrou a aventura de Bartolomé de las Casas (1474-1566), o frade dominicano que viajou com Colombo na sua segunda expedição à América. De las Casas começou participando das expedições que escravizavam os índios. Depois, por tudo que de trágico viu, tornou-se o ferrenho defensor dos direitos dos índios junto à Espanha, ao trono poderoso de Roma e a toda a Igreja Católica. Escreveu um pequeno livro, Confesionario, no qual pregava que antes de se confessar os cristãos deveriam libertar os seus escravos (muitos deles índios). Foi um denunciador da barbárie da colonização da América Latina e escreveu com brilho sobre a pureza da alma indígena. Bem, a América poderia ser Pandora e de las Casas poderia ser Jake Sully. Como se vê, não há nada de novo no front imaginado por Cameron em Avatar. Ele retrata com cores vibrantes, desta feita colorações tecnológicas, uma história já conhecida. Quanto mais alienígena se torna o ambiente com o qual se defrontam os conquistadores de Avatar, mas próximos eles estão das antigas e trágicas conquistas históricas cá na Terra. Dos faraós até George Bush, pai e filho.
Avatar é um filme magnífico. Merece ser visto no detalhe. A trilha sonora é de James Horner (que também escreveu as notas musicais de Titanic e Aliens). A música é incrivelmente, digamos, proporcional à épica do filme. Reveste a imagem 3D com um agradável sabor.
Vejamos como reagirão as multidões que estão a comprar ingressos da obra de Cameron. Espero que possam ir além da óbvia sensação de grandiosidade das imagens e, por assim dizer, possam captar a pequeneza do ser humano frente aos seus pares geneticamente modificados. Afinal, quando as imagens tridimensionais de Avatar se aproximam dos rostos dos expectadores é certo que não dá para pegá-los no ar. Mas, se pudéssemos alcançá-los com as mãos, não seriam outras imagens senão as nossas mesmas.

Um comentário:

Jochi disse...

Vi Avatar neste final de semana.

As imagens são deslumbrantes sob o efeito 3D.

Tinha espectativa de mais de profundidade e novidade nas questões relacionadas à relação do homem com a natureza. A única cena "nova" nesse sentido é quando o personagem agradece o animal quanto o abate para comer.

Também esperava mais originalidade na estória, mas vi somente "chavões". O enredo é quase idêntico ao desenho da Disney Pocahontas.

Chiappa